sexta-feira, 30 de novembro de 2012

A Psicossomática Psicanalítica pela Escola de Paris


Este ramo da psicossomática, cujo mais conhecido expoente é o Frances Pierre Marty que fundou o IPSU, que é um instituto de estudos e atendimento ao público que continua ativo em Paris, adota os pressupostos Freudianos para explicar a dinâmica somática. Esta escola possui muitos psicólogos teóricos e clínicos que contribuem para estender e firmar seus pressupostos, podemos citar Joyce McDougall, Leon Krisler, Rossine Debray, Michel Fain, Christophe Dejours  na frança e Rubens Volich, Flavio Ferraz, Wagner Ranna, Decio Gurfinkel, Éline Batistella, Maria Luiza Guirardi, entre outros no Brasil. Veja o Link do Curso de Especialização em Psicossomática do Sedes Sapientiae. De uma forma geral, utilizamos suas considerações neste Blog, seja fruto de trabalhos publicados ou de contatos em encontros teórico-clínicos, seminários ou mesas redondas.
            Freud desenvolveu seu trabalho através de um pressuposto onde a subjetividade se constitui iniciando com uma fusão à mãe, evoluindo para percepção de sí mesmo e a vivência dos conflitos edípicos, que dão origem ao ser sociopsicosocial que é fruto da constituição do próprio aparelho psíquico. Este aparelho pode ser descrito pela existência das três instâncias, ego, id e superego e suas interdependências e conflitivas no contato com a realidade externa e com as outras pessoas, em especial os responsáveis pelos cuidados da criança nos primeiros anos de sua vida, ou seja, os pais.
            Seguindo a descrição de Rubens Volich em Psicossomática de Hipócrates à Psicanálise, a função materna deve cumprir o papel de viabilizar a vida da criança, que não consegue se desenvolver sem este cuidado. Esta função materna não serve apenas para alimentar e proteger a criança, mas também é fundamental para o desenvolvimento da personalidade da criança e de seu desenvolvimento psicológico sadio.
            A criança vive naturalmente uma fase de fusão com a mãe, na qual suas necessidades primárias são atendidas pela percepção e sintonia desta mãe. A falta ou o excesso da mãe nestas tarefas podem gerar problemas no desenvolvimento com consequências psicológicas, comportamentais ou até somáticas.
            Uma falta da mãe pode levar a criança a um sofrimento tamanho, que leva ao uso recursos defensivos primitivos, somáticos ou comportamentais como no merecismo onde a criança desenvolve vômitos recorrentes, ou no comportamento vazio onde a criança desenvolve uma atonia afetiva e comportamentos automatizados, com ausência de angústia diante de estranhos e atividades mecânicas esvaziadas de fantasia, ternura e alegria. Todas estas manifestações infantis, facilmente reversíveis em tratamento precoce, como mostra Leon Kriesler, podem evoluir para patologias comportamentais ou somáticas se a carência persistir.
            Por outro lado um excesso da mãe, prejudica o desenvolvimento da capacidade simbólica e fantasística da criança, cronificando a mãe como objeto necessário para suprir uma dependência absoluta da criança. Esta situação pode gerar, por exemplo, insônia na criança que necessita do contato visual com a mãe em tempo integral. Outro exemplo de excesso materno é na chamada neonecessidade onde a mãe “fabrica” uma necessidade para a criança, por exemplo dando o seio para suprir qualquer tipo de sofrimento o que leva a criação de substitutos inadequados para a tensão que podem evoluir, por exemplo para a drogadicção.
            Não nos estenderemos aqui na descrição da função paterna, nem na gênese das relações objetais que articularão a pessoa em suas relações sociais. Também não discutiremos a sequencia sadia que leva a criança desde a relação fusional com a mãe até as relações de objeto. Este desenvolvimento pode ser visto em detalhes na obra de Lacan e de Renee Spitz.
            De qualquer forma a capacidade de fantasiar, gera o importante e complexo mecanismo descrito por Freud que satisfaz as tensões internas e externas, através de inúmeras defesas psicológicas neuróticas e originando também muitas vezes as patologias descritas por Freud, que geralmente estão bem circunscritas ao âmbito psicológico. Trata-se da dinâmica pulsional, descrita em a Pulsão e suas Vississitudes e atualizada em Além do Princípio do Prazer.
            Quando esta infra-estrutura psíquica não está plenamente desenvolvida, ou quando o quotidiano leva o sujeito a situações traumáticas recorrentes que superam suas defesas neuróticas, o organismo acaba regressivamente ativando seus recursos comportamentais ou somáticos.
            Estes pacientes podem desenvolver o que Marty chama de doenças de desorganização progressiva, que podem levar a morte como no câncer ou doenças cardíacas, podem desenvolver personalidades vulneráveis ao desenvolvimento de Neuroses de comportamento ou adicções e podem ser mais susceptíveis a desorganizações episódicas que gerem doenças como gripes, problemas de digestão ou outras afecções comumente atribuídas a uma queda de imunidade.
            De qualquer forma Marty descreve uma dinâmica pobre em recursos que lidem com as tensões no nível mental, o que leva as tensões a terem vazão comportamental ou somática.
            Chamo esta abordagem de Psicossomática do transbordamento devido ao fato de que a pessoa poderia ter condições de lidar com a maioria de suas tensões a nível mental, mas devido a falhas no desenvolvimento dos recursos psíquicos teriam um limiar menor a partir do qual a tensão transbordaria para o comportamento e finalmente para a forma mais regressiva que seria a vazão no corpo através das doenças. Marty apresenta em detalhes a psicodinâmica do somatizador e postula minuciosamente os cuidados no tratamento destes pacientes, que deveria ser muito mais relacionado a compartilhar com o paciente uma relação no qual ele possa viver uma experiência da função materna, propiciando um tipo de desenvolvimento das instâncias psíquicas, para somente então desenvolver uma estrutura psíquica capaz de suportar um tratamento psicanalítico clássico que trabalhe a conflitiva edípica.

(Prado, A.F - A Alienação Perceptiva : O Assédio Moral Infantil e sua relação com os processos de somatização, Cap 6 - Monografia Especialização em Psicossomática Sedes Sapientiae)

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